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"Ai dos pastores de Israel que se apascentam a si mesmos" Ez. 34-2

Por Rui Costa Barbosa
Bispo da Igreja Anglicana Tradicional 

A atitude dos ministros que Deus levantara já era motivo de preocupação desde os tempos proféticos. Aqui nesse texto de Ezequiel 34, o profeta foi encarregado de levantar sua voz contra uma série de tipos de pastores e suas condutas reprováveis.

Desde os preguiçosos e descuidados que não queriam enfrentar o trabalho pastoral, de acompanhar as ovelhas, curar as suas feridas espirituais e outros descuidos muito comuns ainda nos dias de hoje.

Mas na base desses desvios está presente invariavelmente uma das piores pragas da humanidade: a falta de fidelidade. A Bíblia nos apresenta nosso Deus como absolutamente fiel: “Saberás, pois, que o Senhor teu Deus é que é Deus, o Deus fiel, que guarda o pacto e a misericórdia, até mil gerações.” Dt 7:9. A Bíblia também requer que tenhamos em Deus o paradigma moral. Assim o infiel é antes de tudo contra Deus, é inimigo de Deus, e as conseqüências dessa desobediência serão muito desagradáveis, segundo as Escrituras.

Estamos vivendo uma versão moderna de infidelidade de pastores. O anglicanismo está passando nos últimos 20 anos, por um momento que nunca experimentara antes, embora o processo de diversificação já tenha ocorrido em muitas de outras denominações históricas. Assim surge no cenário religioso mundial a figura do “anglicanismo continuante” com a missão de salvaguardar a pureza e a ortodoxia do anglicanismo original. Nesse burburinho de novas denominações, novas siglas, novos bispos, tem aparecido certo número de espertalhões, de várias e duvidosas origens, muitos sem nenhum contato anterior com o anglicanismo, que estão se convertendo apenas para serem ordenados ao diaconato e ao presbiterato, para logo após darem um pontapé em quem que deu crédito, tomando o rumo que bem lhe convier.

Nossa denominação já sofreu com essa nova praga. Ao ponto de alguém ser ordenado presbítero em um dia para não mais do que 40 dias depois despedir-se alegando “motivos pessoais”. Quais seriam esses “motivos pessoais”? Será que esses motivos surgiram assim tão de repente? Pode ser. (Estou admirado de que tão depressa estejais desertando daquele que vos chamou na graça de Cristo, para outro evangelho Gl 1:6). Então resolvi reler a declaração que o candidato fez no dia de sua ordenação, conhecida como “Votos Sagrados”: “Eu declaro, tendo Deus por testemunha, que serei leal à Doutrina, à Disciplina e à Adoração de Cristo da forma como essa jurisdição eclesiástica as tem recebido e permanecerei em união na caridade, de acordo com os Cânones da Igreja Anglicana Católica – Diocese do Brasil, com os outros Ministros que possam ter autoridade sobre mim ou sobre meu ministério”. A declaração acima começa com uma invocação divina (tendo Deus por testemunha), como paradigma moral que logo é esquecido pelo declarante mal intencionado. É dessa forma que ele se torna sacrílego, dessa forma é que se torna inimigo de Deus. O declarante então diz que será leal à Doutrina e à Adoração de Cristo, mas no contexto da Igreja, ao bispo que o está ordenando, não para arrepiar-se e arvorar-se no direito de caminhar por suas próprias pernas. E isso ele também declara tendo as suas mãos entre as mãos do bispo! Hipocrisia e premeditação – eis o binômio que dá sustento à infidelidade moderna, pois em geral esses falsos pastores já sabem que tão logo coloquem a mão na Bula de Ordenação desferirão tamanho pontapé não somente no bispo que o está ordenando como em todos os outros irmãos que se empenham, se esforçam para que tal evento ocorra com a dignidade necessária ao culto divino.

Assim, oriento aos irmãos fieis, aos que com sofrimento enfrentam o ministério que Deus nos concedeu e nos honrou, que não se espantem com esse malicioso pecado. (Sê fiel até a morte, e te darei a coroa da vida – eis o nosso prêmio maravilhoso). Haveremos de ver ainda muitos que assim procederão, atraindo para si as condenações que merecerem.

Desejamos colaborar para interromper esse processo canibalesco a que estamos submetidos. Não aceitaremos candidatos que abandonem suas denominações sem motivo justo, os que estejam buscando apenas auto-promoção. Vamos prestigiar as novas vocações, não os que querem apenas usar o privilégio episcopal para sua própria satisfação. E esperamos que as denominações co-irmãs também tenham a delicadeza de assim proceder, pois sem campo para pousar, esses aventureiros irão no máximo voltar para a insignificância de onde saíram enganando a muitos. E que Deus se apiede se suas almas.

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