Páginas

Posição da IAC Frente aos Recentes Acontecimentos


Por Rui Costa Barbosa
Bispo Diocesano


Não podemos caminhar indefinidamente. Temos que de tempos em tempos parar e fazer um retrospectiva, analisar a situação e fazer projeções. Isso vale para nossa vida pessoal, profissional e também ministerial. E esse é um momento propício para uma reflexão profunda, sem paixões e sem condescendências.

Após o primeiro impacto da crise que vive o Anglicanismo mundial desde as ordenações femininas até as mais recentes manifestações de liberalismo explícito que assolou a então quase integral igreja anglicana mundial, vale dizer, a comunhão de Cantuária, temos vivido uma série de movimentos e acomodações na liderança daquela igreja. Gastando gigantesco esforço na tentativa de manter a unidade da qual em todo o mundo somente o anglicanismo parecia desfrutar, a comunhão aqui no Brasil, assolada por uma disputa fenomenal na região nordeste não teve como evitar o surgimento de um movimento que se convencionou chamar de “anglicanismo continuante”, absorvendo-se o mesmo termo que designava outros movimentos na Europa, principalmente Inglaterra, com o mesmo viés, mas com características próprias, cada um ao seu estilo.

Não podendo aproveitar todas as vocações que foram surgindo nesse ínterim, não pode evitar a igreja predominante o surgimento de novas lideranças, cada uma logicamente trazendo para o cenário anglicano uma nova denominação, diferente umas das outras por detalhes sutis (e algumas vezes hilariantes).

Incapazes de se organizar em torno dos pontos de convergência, essas novas denominações supostamente anglicanas, e diz-se supostamente porque algumas foram criadas por quem não tinha qualquer ligação anterior com o anglicanismo, preferiu cada um fincar-se atrás de suas próprias trincheiras. Conversões quase não há, pois o movimento neo-pentecostal tem devastado a Seara como locusta. Então o que fazer para crescer numericamente a fim de justificar a satisfação do desejo incontrolável de alguns de chegar ao episcopado? Uma das táticas tem sido o “autofagismo” ou o “canibalismo” mútuo entre essas denominações. Assim uma denominação cresce (num momento), mas a Igreja de Cristo não cresce, pois a outra denominação se enfraquece. Esses “métodos” exigem a exteriorização de certos comportamentos aéticos vergonhosamente encetados por uns que vivem pela Internet fazendo infernal proselitismo.

Nossa reflexão nesse momento importante da vida dessas igrejas continuantes representa um protesto contra esse estado de coisas. Temos presenciado o surgimento de lideranças sem o menor preparo intelectual e teológico. Bispos de si mesmos. Denominações cujo clero é maior do que o próprio povo. Esse quadro trás perspectivas sombrias para o futuro do anglicanismo continuante do Brasil, entendido como a salvaguarda dos princípios ortodoxos do anglicanismo anterior ao ataque liberalista.

Por causa da ambição desmedida de quem não sabe que o bispado é um serviço, uma renúncia e não um título de merecimento, que expõe o titulado ao estrelato religioso nacional (e quiçá internacional), temos assistido uma série de fatos e conchavos impensáveis tempos atrás. Pessoas que a pouco se digladiaram em episódios dantescos passaram a apoiar-se mutuamente apenas para atingirem objetivos discutíveis. Surge o insólito: o anglicanismo pentecostal, as missas anglicanas de exorcismo, o anglicanismo que desconhece a liturgia baseada no Livro de Oração Comum, e tantas outras mazelas como o citado “pescar no aquário alheio”.

Essa reflexão serve para explicitarmos que nossa Jurisdição não se coaduna com esse tipo de procedimento. Condenamos veementemente esses conchavos e esses alinhamentos fisiológicos. Somos uma Jurisdição verdadeiramente autônoma e independente e não abriremos mão dessa postura de independência.

Os continuantes no Brasil têm sido incapazes de produzir coisas concretas para o benefício do Reino de Deus. A exceção poderia ter sido um movimento que passou a ser chamado de “Causa Comum”. Mas como quase nada há de comum entre essas denominações, exceto possivelmente a vaidade dos cargos eclesiásticos, principalmente o de bispo, o movimento mantém-se paradoxalmente inativo. Na verdade é formado por um agrupamento bastante heterogêneo, a maioria de inexpressiva representação que abriu mão de sua própria estruturação para permanecer acomodados sob a batina do mais proeminente, o qual já tem bastantes problemas para resolver em sua diocese cismática. Por isso aproveitamos para esclarecer que nossa Jurisdição não está e nem pretende estar alinhada nesse movimento, e esse não-alinhamento não é por mera arrogância, mas porque não observamos nesse “movimento” qualquer pista dos motivos para os quais foi erigido e temos dúvidas de para que venha a servir no futuro próximo, particularmente após Lambeth 2008.

Estamos seguros que nossa trajetória, ainda que sem crescimento exagerado, ao tempo de Deus, deverá se dar sob o signo da independência e autonomia. Não faremos concessões por puro fisiologismo nem incentivamos que clérigos de outras denominações venham para nossas fileiras tão somente para enfraquecer qualquer uma outra denominação. Respeitaremos a ortodoxia da igreja não sagrando novos bispos apenas para não perder ou para aumentar quadros. Mas haveremos de levantar nossa voz cada vez que tivermos conhecimento de fatos que depõe contra as coisas de Deus, que representem apenas a vontade do homem e principalmente as que agridam a nossa autonomia jurisdicional. E os que estão enfileirados conosco haverão de ter sempre a honra de pertencer a uma Jurisdição séria, que não transige pelas circunstâncias, que valoriza o trabalho e premia o esforço.

Nenhum comentário: