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Análise da Conjuntura Atual

Vivemos tempos difíceis, a nação acha-se sacudida por intensos movimentos sociais antagônicos. Uns apontando as mazelas dos atuais governantes, como se a corrupção fosse um fato novo e de exclusividade tupiniquim. No entanto basta apelarmos para a memória recente e lembraremos de notícias sobre o mesmo tema oriundas tanto de países socialistas quanto do teocrático Vaticano.

A corrupção em um certo nível é resistente em todas as sociedades. Ocorre que vez ou outra os agentes da corrupção exageram e a sujeira vem à tona. A corrupção não é um fenômeno partidário, talvez sequer político. A corrupção é um problema cultural, portanto intimamente ligado ao indivíduo. Trata-se de um fenômeno conjuntural que somente poderá ser debelado por meio da ferramenta que muda o mundo: a educação. Ocorre que esta também está vilipendiada em nossa pátria. Muitos dos que se arvoram a falar sobre a corrupção esquecem-se que ela está presente na sua própria vida, na sua própria família, quando o pai ou a mãe fazem a tarefa de casa do filho preguiçoso, quando se paga por favorecimento de pequenos serviços governamentais para que sejam mais prontos, quando a prontidão do atendimento deveria ser algo normal.

Há pessoas que frequentemente se orgulham de ter obtido inúmeras pequenas vantagens pela sua "esperteza" em detrimento da falha ou da inabilidade de outras pessoas. A estas pequenas corrupções parecem não dar atenção, embora estas práticas sejam ótimas para formar o caráter do futuro adulto. Muitos criticam mutretas mas apenas porque não foram convidados a delas participar, pois uma mutreta é um ilícito para o concurso da qual não puderam estar envolvidos.

Por outro lado não podemos olvidar a realidade de que as disputas sociais sempre existiram e sempre existirão. Há uma tendência odiosa de querer amealhar fortunas a custa da exploração de outros. E esta tendência também não é exclusividade de um ou de outro sistema político/econômico. Meu falecido pai, comunista desde sempre, ao final da vida me orientava: "Meu filho, o capitalismo é a exploração do homem pelo homem. O socialismo é o inverso", numa clara decepção de constatar esta mesma tendência num sistema que sonhara perfeito.

Mas voltando ao início, a nação acha-se abalada. Os defensores da situação, acho eu que com honesta sinceridade e enorme sentimento patriótico, encontram em certos personagens, agentes da direita trabalhando contra o povo. O Juiz Sérgio Moro é um deles. Mas pelo que eu saiba não é o Juiz Moro que produz as provas mas sim o sistema policial, mais precisamente a Polícia Federal, instituição das mais respeitáveis até mesmo pelos malfeitores comuns, pois preferem ficar sob a custódia da PF do que de qualquer outra agência policial. Também não é o Juiz Moro que induz os depoimentos dos que, temerosos de enfrentar anos longos de prisão, fazem acordos de delação. Daí o assunto vai para a mídia. A grande mídia peca muito mais pela omissão do que pela publicação de fatos. Nada se falou na grande mídia comprometida, por exemplo, de que o governador de São Paulo colocou  o Estado em risco de intervenção federal por não cumprir tempestivamente ordem judicial de pagar os dias aos professores grevistas no primeiro semestre de 2015. No entanto não é a grande mídia que inventa as notícias desfavoráveis aos políticos, independentemente de seus partidos, até porque em nossa sociedade o papel dos partidos é sobrepujado pelo carisma das pessoas.

Por outro lado, cansados de não poderem viver com dignidade, pois lhes faltam segurança nas ruas, educação nas escolas e alívio nos hospitais, cidadãos de todas as classes, conjecturam, cada um a seu modo, por mudanças sociais, políticas e econômicas, justiça social e equidade na arrecadação dos impostos. Temas correlatos como "ensinar a pescar" e xenofobismo discriminatório aproveitam- se para aflorar. Daí para admitirem a implantação de um "regime forte", civil ou militar, é um pulo, o que também se constitui em um engano.

Estamos portanto em uma situação incomum: por um lado a população não aprova o governo atual, e mesmo que alguém queira contestar os resultados das pesquisas dos institutos "burgueses", basta andar pelas ruas e ouvir a voz do povo. Pequenos e médios comerciantes e industriais estão aflitos com a situação. No meu bairro temos um depósito de materiais de construção cujo dono, nosso amigo a mais de 20 anos declarou que o faturamento despencou mais de 40%. Outro amigo que comanda uma pequena metalúrgica de 300 empregados confessou que está prestes a falir, já tendo concedido férias coletivas e descanso remunerado restando agora apenas, demiti-los, pois o mercado não dá sinais de reação positiva.

Por outro lado teme-se um retrocesso institucional, com as consequências já vividas durante o regime militar de 64: falta de garantias individuais, supressão da atividade parlamentar, juízo discricionário e controle da comunicação social (censura).

Resta-nos, pois, me parece, que devemos enquanto cidadãos preocupados com o futuro da pátria, dos nossos descendentes, buscarmos a construção de um novo caminho, como já fizemos no passado.
Porém que rumos seguir? Surge, já que somos cristãos, a alternativa de olharmos para as Escrituras.

Mas as Escrituras, salvo melhor juízo, não nos aponta uma solução proveniente do povo. Encontramos na Bíblia um Deus libertador, porém a salvação do povo vem sempre de cima, seja diretamente do poder de Jeová, como na inusitada demonstração de força e poder na separação das águas do Mar Vermelho, durante o êxodo, ou na ação individual de alguns heróis, como o do gileadita Jefté, do cabeludo Sansão ou do destemido pastor de ovelhas Davi. Mas eu gosto mais de olhar para a parte das Escrituras que nos ensina a agir para nossa própria salvação: quando o povo recém saído do Egito começou a trazer problemas para Moisés, este apelou a Jeová que lhe replicou: "Por que vens a mim, diga ao povo que marche!" Ou da ordem que Jesus dá aos homens presentes na ressuscitação de Lázaro: "Removam a pedra!". Já que Ele iria realizar o milagre maior da ressuscitação por que não determinar que a pedra rolasse sozinha? Simples, porque ressuscitar Lázaro somente Ele poderia, mas rolar a pedra os homens poderiam. Assim penso que Deus não fará por nós aquilo que podemos fazer. E podemos fazer a construção de um sistema social mais justo e igualitário.

Finalizo lembrando que a Igreja, e cada um de nós,  deve fazer, como determinamos em nosso Encontro na Cidade de Salvador, uma opção pelos pobres, pelos doentes, pelos oprimidos, pelos fracos e pelos perseguidos de toda sorte (Ezequiel 34), mas não devemos no âmbito da Igreja tratar sobre estas preocupações em nível partidário. Podemos discutir política sempre do ponto de vista teórico, pois quando radicalizamos nossos argumentos, quando não buscamos compreender o ponto de vista diverso, estamos trabalhando contra a implantação do sistema justo e igualitário que é sonho de todos nós. Permaneçamos unidos pelo poder de Deus e fraternos no amor do Cristo, que a todos liberta.

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